20/07/2020
Foi publicada nesta quinta-feira (16 de junho) no Diário Oficial da União (DOU), a Lei nº 14.026/2020, que atualiza o marco legal do saneamento básico no País. O presidente Jair Bolsonaro fez 11 vetos à lei aprovada pelo Congresso.
A nova lei extingue os chamados contratos de programa, firmados, sem licitação, entre municípios e empresas estaduais de saneamento.
O texto prevê a continuação dos contratos de programas que estão em vigência, mas estabelece a obrigatoriedade de realização de licitações para delegação dos serviços, os quais não mais poderão ser firmados pelos chamados contratos de programa para a prestação de serviços de abastecimento de água e de esgotamento sanitário.
Essa modalidade de contrato é a que hoje é utilizada na prestação de serviço pelas companhias estaduais de saneamento. Tais contratos são firmados sem concorrência e celebrados diretamente entre os titulares dos serviços e as concessionárias.
Entretanto, o Presidente decidiu vetar trecho que trata de um período de transição para que os contratos firmados pelas empresas estatais sejam mantidos nas regras anteriores à lei.
Assim, cria-se espaço para os contratos de concessão e torna obrigatória a abertura de licitação para os prestadores de serviço públicos e privados, possibilitando a ampliação para a realização de licitação com a participação de empresas públicas e privadas, com o fim do direito de preferência das companhias estaduais e com o aumento da concorrência na prestação dos serviços de abastecimento de água e de esgotamento sanitário.
Também há a permissão da prestação regionalizada, com estabelecimento de blocos regionalizados de municípios com o objetivo de se obter ganhos de escala e de se garantir viabilidade econômico-financeira dos serviços, para se atingir à universalização dos serviços e possibilita a organização regional, mas atendendo as peculiaridades locais.
A Lei prorroga o prazo para o fim dos lixões, concedendo prazo adicional para as prefeituras realizarem tal erradicação e passarem a dispor os resíduos sólidos urbanos em aterros sanitários.
Assim, cabe dizer que a lei em vigor previa que os lixões deveriam ter sido erradicados em 2014, o que não ocorreu e houve prorrogação para 31 de dezembro de 2020.
Mas tal prazo não vai valer para municípios criem “plano intermunicipal de resíduos sólidos ou plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos e que disponham de mecanismos de cobrança que garantam sua sustentabilidade econômico-financeira”.
Para esses casos, os prazos vão variar de agosto de 2021 a agosto de 2024, dependendo da localização e do tamanho do município. Isso facilita a concessão de estatais do setor à iniciativa privada, o que tende também a aumentar a competitividade deste mercado.
A Lei também atribui à Agência Natural de Águas (ANA) a competência de elaborar normas nacionais de referência regulatória para o setor de saneamento básico visando a uniformização regulatória em todo território nacional.
Principais vetos da Presidência (Mensagem nº 396, de 15 de Julho de 2020)
Embora foram vetados 11 dispositivos do texto da Projeto de Lei, os que mais causaram impactos no texto aprovado pelo senado foram os seguintes:
- Art. 16, que regularizava os contratos de programa e criava um tipo de regime de transição por meio da possibilidade de prorrogação;
O art. 16 do Projeto de Lei nº 4.162/2019 tratava e previa a possibilidade de prorrogação, a saber:
“Artigo 16. Os contratos de programa vigentes e as situações de fato de prestação dos serviços públicos de saneamento básico por empresa pública ou sociedade de economia mista, assim consideradas aquelas em que tal prestação ocorra sem a assinatura, a qualquer tempo, de contrato de programa, ou cuja vigência esteja expirada, poderão ser reconhecidas como contratos de programa e formalizadas ou renovados mediante acordo entre as partes, até 31 de março de 2022.
Parágrafo único. Os contratos reconhecidos e os renovados terão prazo máximo de vigência de 30 (trinta) anos e deverão conter, expressamente, sob pena de nulidade, as cláusulas essenciais previstas no artigo 10-A e a comprovação prevista no artigo 10-B da Lei nº 11.445, de 5 de janeiro de 2007, sendo absolutamente vedada nova prorrogação ou adição de vigência contratual”. (original sem destaque)
De acordo com a Mensagem nº 396, de 15 de Julho de 2020, as razões do veto presidencial foram baseado na seguinte justificativa:
“A propositura legislativa, ao regularizar e reconhecer os contratos de programa, situações não formalizadas de prestação de serviços públicos de saneamento básico por empresa pública ou sociedade de economia mista, bem como possibilitar a prorrogação por 30 anos das atuais avenças, prolonga de forma demasiada a situação atual, de forma a postergar soluções para os impactos ambientais e de saúde pública decorrentes da falta de saneamento básico e da gestão inadequada da limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos. Ademais, a proposta, além de limitar a livre iniciativa e a livre concorrência, está em descompasso com os objetivos do novo marco legal do saneamento básico que orienta a celebração de contratos de concessão, mediante prévia licitação, estimulando a competitividade da prestação desses serviços com eficiência e eficácia, o que por sua vez contribui para melhores resultados.”
- Art. 20, que afastava a aplicação da nova lei para os serviços de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos.
O art. 20 do Projeto de Lei nº 4.162/2019 previa a aplicação da nova lei apenas para os serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário, afastando sua aplicação os serviços de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos. Veja-se:
“Art. 20. Aplicam-se apenas aos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário os seguintes dispositivos:
I – da Lei nº 11.107, de 6 de abril de 2005, o § 8º do art. 13;
II – da Lei nº 11.445, de 5 de janeiro de 2007:
a) o art. 8º;
b) o art. 10;
c) o art. 10-A.”
De acordo com a Mensagem nº 396, de 15 de Julho de 2020, as razões do veto presidencial se deu pela seguinte causa:
“A propositura legislativa, ao afastar para os serviços de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos, a aplicação do § 8º, do art. 13 da Lei nº 11.107, de 2005 (normas gerais de contratação de consórcios públicos) e dos artigos 8º, 10 e 10-A, da Lei nº 11.445, de 2007 (diretrizes nacionais para o saneamento básico), quebra a isonomia entre as atividades de saneamento básico, de forma a impactar negativamente na competição saudável entre os interessados na prestação desses serviços, além de tornar menos atraente os investimentos, em descompasso com a almejada universalização dos serviços, foco do novo marco do saneamento, que busca promover ganhos de qualidade, efetividade e melhor relação custo-benefício para a população atendida.”
Os vetos e o texto final do novo marco legal do saneamento divide opiniões sobre sua eficácia, principalmente quando se trata da possibilidade da privatização sobre o acesso aos recursos hídricos.
Entretanto, há grande expectativa de que a mudança na legislação gere condições de investimento e ambiente de negócio que possam favorecer a ampliação dos serviços de abastecimento de água e de coleta de esgoto. Mas é inegável que a nova Lei traz diversas melhorias às regras do marco regulatório para o saneamento básico, o que irá ampliar os investimentos privados nesse setor.
Estima-se que para atingir as metas de universalização será necessário investimentos da ordem de quase R$ 750 bilhões, o que tem o potencial de atrair grandes investimentos (nacionais e internacionais) e aumentar a geração de empregos no país.
A equipe de Direito Público do Leite, Tosto e Barros está à disposição para orientá-los sobre esse assunto .
*Colaboraram com esse artigo os sócios Paula Cabral Padilha e Eduardo Nobre.