01.12.2020
O Senado aprovou na última quarta-feira, dia 25 de novembro de 2020, o Projeto de Lei nº 4.458/2020, modificando a Lei 11.101/05, que regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária. Aguarda-se, agora, a sanção presidencial para que a Lei possa ser publicada, e passe a viger 30 dias após a sua publicação.
Nesse informativo, nos limitaremos a destacar as alterações referentes aos requisitos para o ajuizamento da Recuperação Judicial pelo produtor rural pessoa física, inscrito há menos de dois anos na Junta Comercial.
As discussões sobre o tema antecedem as deliberações da Câmara e do Senado, e estão centradas no artigo 48 da Lei 11.101/05, segundo o qual “poderá requerer recuperação judicial o devedor que, no momento do pedido, exerça regularmente suas atividades há mais de 2 anos…”
É essa a regra definida originalmente pela Lei 11.101/05, que obriga o empresário ou a sociedade empresária a comprovar que explora regularmente a sua atividade, ou seja, com a inscrição perante a Junta Comercial, em prazo superior aos 2 anos que antecederem o ajuizamento da Recuperação Judicial.
Ocorre que, o STJ, em recentes julgamentos, flexibilizou essa regra, dispensando o empresário rural da referida inscrição com antecedência superior a dois anos do pedido de Recuperação Judicial, o que continua sendo obrigatório para o empresário comum.
Em consonância com essa flexibilização, as inclusões no modificativo aprovado dos parágrafos 3º, 4º e 5º ao artigo 48[1] da lei, preveem que a comprovação do prazo de dois anos indicado no artigo 48, quando se tratar do produtor rural pessoa física, deverá ser calculado com base no (i) Livro Caixa Digital do Produtor Rural, ou por meio de registros contábeis que substitua o LCDPR, bem como (ii) pela Declaração de Imposto de Renda e Balanço Patrimonial, desde que entregues tempestivamente.
Ou seja, a despeito do modificativo determinar a apresentação cumulativa dos documentos, e de obrigar o produtor rural a observar a legislação contábil que rege os referidos documentos, é absolutamente preocupante o fato do modificativo aprovado se apoiar em documentos meramente contábeis e unilaterais para a aferição do prazo de 2 anos, descartando o regime público da Junta Comercial e todas as suas formalidades.
Em outras palavras, o modificativo vem selar a possibilidade de determinados empresários não regulares (os produtores rurais) promoverem suas recuperações judiciais sem a comprovação do tempestivo registro, cumprindo ao Judiciário a mais estrita fiscalização dos documentos contábeis a serem apresentados nos termos do modificativo, sob pena de mais uma vez se estar banalizando o instituto da recuperação judicial.
Outra questão que ainda poderá trazer grandes questionamentos seriam quais os créditos efetivamente sujeitos a recuperação judicial dos produtores rurais. Isto porque o § 6º do artigo 48 [2] do Projeto de Lei dispõe que somente os créditos decorrentes da atividade rural estariam sujeitos a recuperação judicial, devendo estes créditos estarem devidamente discriminados nos documentos contábeis do empresário rural. Ora, mais uma vez, o Projeto de Lei trará grande instabilidade ao sistema jurídico, pois, certamente, existirão grandes questionamentos acerca dos créditos que deverão – ou não – ser objeto da recuperação judicial, caso o registro contábil do empresário rural seja lacônico.
Por fim, também destacamos que, paralelamente às alterações ocorridas no âmbito da Lei 11.101/05, o modificativo aprovado pelo Senado também trouxe relevante alteração à Lei 8.929/94, que trata da Cédula de Produto Rural (“CPR”)
Conforme os parágrafos 1º e 2º acrescidos ao artigo 11 da referida lei[3], não se submeterá à Recuperação Judicial a CPR com liquidação física – paga ao credor com a entrega de produtos rurais – em caso de antecipação total ou parcial de seu preço, ou que se vincule à operação de troca de insumos.
Diante desse cenário, a alteração passa a viabilizar ao credor o pedido de restituição, e ao devedor a possibilidade de comprovar o caso fortuito e a força maior que impeça a entrega dos produtos, prevendo o modificativo que caberá ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) definir quais atos e eventos poderão ser caracterizados como caso fortuito ou força maior para fins desse artigo.
A despeito do avanço trazido com a aparente exclusão desse tipo de crédito, identifica-se que o credor, mais uma vez, não estará em posição segura, já que o recuperando inevitavelmente alegará o caso fortuito e/ou a força maior, cumprindo às partes aguardarem a posição do MAPA e das políticas a ele inerentes, ou de decisões judiciais que venham a modular o entendimento em favor do devedor, emitente da CPR.
A equipe do Leite, Tosto e Barros está à disposição para orientá-los sobre esse assunto.
*Esse boletim teve colaboração dos sócios: Charles Gruenberg, Rodrigo Quadrante e Carlos D’Avila.